Em sua longa história, as grandes religiões monoteístas ofereceram o Paraíso, como prêmio para os seus seguidores, se eles seguissem os seus dogmas e mandamentos, acreditarem neste ou naquele mito, louvar e puxar o saco de amiguinhos imaginários, construírem templos aos montes nas periferias das cidades, cantarem musicas de má qualidade, rezarem muito por horas a fio, abster-se de muitas coisas e prazeres da vida, incomodar os outros para tentar convertê-los à religião deles, e alegarem que possuem a “verdade” e que todos os outros estão errados (e todos alegam a mesma coisa), além de viverem com as caras enfiadas dentro de livros ditos “sagrados” e escritos por “inspiração divina” e recitarem determinados trechos (esquecendo convenientemente de todo o resto), sempre interpretando à sua maneira, com truques circenses da teologia, para tentar dizer que amarelo é vermelho, e que azul é verde, mas que laranja não é laranja.
Enfim, são muitas dessas coisas que fazem parte da rotina de um religioso que procura seguir suas profissões de fé, além de se odiarem mutuamente e promoverem preconceito, discriminação, intolerância, incapacidade de diálogo civilizado, ameaças de morte e inferno (disfarçadas como avisos, que é o que a Bíblia diz que é a “verdade”, que é a “realidade” etc.), causarem conflitos e guerras em diversos países do planeta, perseguições, uso e abuso de falácias, disseminação de ignorância (coisas como o criacionismo, por exemplo), ataques contra o bom senso moral e ético (o uso de camisinhas para impedir a disseminação de doenças sexuais e gravidez indesejada), contra a ciência e a tecnologia (como o caso das células-tronco, clonagem humana, etc.), acobertamento de criminosos no uso de dois pesos e duas medidas (padres pedófilos, além exemplo), etc.
Porém ainda há uma questão a abordar. Existe um Paraíso? Há provas da existência de tal lugar? Quais são as evidencias que sustentam as alegações dos religiosos de que há uma “vida eterna”?
Para sermos sinceros, a resposta é NÃO! Simplesmente não há evidências da existência de tal lugar. Tudo o que os religiosos possuem são apenas as suas crenças e as palavras que constam de seus livros ditos “sagrados”.
Crenças não provam nada, como todos sabemos. Não há provas. Não há fatos. Não há evidências. Não há registros. Não há documentos. Não há relatos fidedignos. Não há testemunhas. Não há fotos. Não há filmes. Não há objetos “celestiais”. Não há indicações diretas. Não há base sólida que sustente as alegações. Ninguém nunca voltou da morte para contar o que há após a morte. Não há indicações da localização de tal lugar. Nada de nada. Tudo o que as religiões oferecem são apenas fantasias, ilusões, conceitos abstratos, e pedem (ou exigem) que o crente tenha fé, acredite por acreditar, ou seduzi-lo com promessas, confortar com falsas miragens, a idéia de algo melhor do que a vida na Terra.
Todas as descrições são vagas, escassas, incompletas, fragmentadas. Uns dizem que é um lugar onde se “vive” para sempre, sem doenças, sem sofrimento, sem morte. Onde só há alegria eterna. Onde se pode cantar glórias e louvores para sempre, se pode morar em mansões de ouro, ter virgens para satisfazer todos os seus caprichos sexuais reprimidos, ter um mundo só seu para governar e sentar-se ao lado de um deus (preencha aqui um deus qualquer, pois quase todas as religiões prometem isso). Além disso, há a promessa que você verá a “face de Jesus” em toda a sua “glória”, junto com anjos tocando harpas e (o melhor de tudo, segundo o padrão moral de muitos religiosos) você verá de camarote o sofrimento dos condenados ao Inferno e regojizar-se com isso, num momento sádico só seu. Ainda você terá um lugar que fica no meio das nuvens, tudo bem celestial, numa brancura total, onde São Pedro guarda as chaves do local e examina um tal de “Livro da Vida” para ver se você merece uma vaga ou não, ou que haverá julgamentos e decide-se o destino final da pessoa.
Enfim, todas essas coisas que fazem parte do imaginário religioso, ou seja, crendices e lendas. Fábulas mitológicas.
Mas supondo que haja um Paraíso, é hora de explicar porque é que eu não quero ir para lá.
Primeiro de tudo, há a questão da “vida eterna”. O que exatamente eu vou fazer com o tempo de uma vida eterna? Ler todos os livros que já foram escritos no planeta? Assistir todos os filmes e seriados que tenham sido lançados desde que inventaram esta arte? Conhecer cada um dos moradores do Paraíso em sua totalidade? Andar a pé pelo Universo todo? Assistir tudo e todos na Terra nascerem, viverem e morrerem, até a extinção da vida na Terra daqui a 5 bilhões de anos, quando o Sol se tornar uma Gigante Vermelha? Assistir a evolução de uma nova espécie inteligente, milhões de anos após o Homo sapiens se for?
Será que há possibilidade de trabalhar no Paraíso, construir uma sociedade, uma civilização? Escrever livros? Criar filmes? Realizar obras de arte e arquitetura? Desenvolver a ciência e a tecnologia? Lançar-me numa exploração espacial? Explorar os segredos da vida e do Universo? Estabelecer relacionamentos, casar, ter filhos e filhas, divorciar-me e casar de novo? Ter relações sexuais? Aprender novas línguas? Mas, isso tudo durante a Eternidade. Fazem idéia do que isso significa? Mesmo que eu queira ver todos os filmes, novelas, produções artísticas, óperas, peças de teatro, ler todos os livros que já foram escritos, desde a primeira inscrição num tablete de argila até o último romance escrito pouco antes da humanidade sumir da face da Terra etc., ainda assim terei mais um infinito espaço de tempo à minha frente, pois Eternidade é isso: tempo eterno. Mas, fazendo o quê? Espíritas falam que nascemos, morremos, vam,s a outro plano, ficamos por lá, reencarnamos, começa tudo de novo, morremos, e por aí vai. Chegará um ponto – ainda segundo o Espiritismo – que o espírito não encarnará mais; que ele guiará outros. Mas, e quando TODOS os espíritos estiverem evoluídos? O que acontece? Ninguém diz, pois ninguém pensou nisso.
A bem da verdade, não há nenhuma possibilidade disso, segundo as religiões, pois o que elas oferecem é que você ficará louvando Jesus, Deus ou sua entidade divina favorita para todo o sempre, cantando glorias e aleluias ininterruptamente, e morar numa mansão dourada com ruas de ouro, segundo visões de vertentes cristãs que parecem mais se apegar ao materialismo que o mais ferrenho dos ateus, pois a visão que eles têm de mundo é poder e riqueza. Mas a religião não serve para nos elevar espiritualmente? São os mistérios que se escondem na mentalidade religiosa fanática.
Imaginem que estaremos esperando que apareçam os profetas e os “grandes” homens (e nenhuma mulher) das narrativas bíblicas, corânicas e talmúdicas. E ficar sentado à direita de seu mito favorito (e fazer o que lá, exatamente? Pedir autógrafo? Tirar uma foto que nem criança que vai tirar foto com Papai Noel de shopping?).
Teremos a possibilidade de, talvez, ganhar de presente umas 70 virgens para te acompanhar pelo resto da eternidade, só não sei como elas continuarão virgens depois de 2 dias. O sagrado hímen complacente? Deve ser. Haverá a possibilidade de você comer, beber, urinar, defecar e fazer sexo? As religiões nada dizem. Até as suas necessidades humanas mais básicas são negadas, não que eu me incomode em nunca mais ter que parar de ver um jogo de futebol para ter que ir ao banheiro, mas ficar sem comer umas batatas fritas de vez em quando é sacanagem! Você só existe nesta vida, dizem as religiões, para que você tenha uma vida eterna onde você não é mais você, e sim um mero puxa-saco que tem a obrigação de massagear o ego de alguém tão superior que, a priori, não tem ego que possa ser massageado (ou tem?). É a abdicação de quase tudo que faz de você um ser humano.
Pensem que não há a menor possibilidade de você amar, pensar, correr, andar, sentir o vento no rosto numa tarde de primavera, escrever suas memórias ou coisa que você gosta, ler, admirar a natureza, comer, cozinhar, beber, preparar algo especial para alguém que você gosta, viajar, velejar, dirigir, ter saudades, construir coisas, planejar, desenvolver e mais um milhão de desejos e atitudes que nos caracterizam. Não mesmo. Você só estará lá para uma única coisa: louvar!
Outra coisa. E o que dizer das supostas outras pessoas que estarão no Paraíso? Já conseguiu se imaginar como é conviver com pessoas de todas as épocas, de todas as culturas, de todos os lugares, de todas as línguas, de todos os comportamentos, de todos os costumes, de todas as diferenças possíveis? E todas elas reunidas em um só lugar, aos milhões ou centenas de milhões? É um pensamento interessante. Poderei discutir matemática com Isaac Newton? Falar das descobertas astronômicas com Galileu? Fazer “tsc tsc” para Cláudio Ptolomeu, porque ele inventou a pseudociência da Astrologia, mas dar um tapinha nas costas dele por compreender que ele não tinha os meios que dispomos hoje? Poderemos ouvir Shakespeare recitar um poema inédito? Veremos Sófocles encenar uma de suas inúmeras peças que se perderam no tempo? Poderei reunir todos os quatro evangelistas e discutir as discrepâncias entre os evangelhos? Poderei sacanear Aníbal por ele ter tido a idéia de jerico ao cruzar os Pirineus com elefantes, para depois jogar Warcraft contra Caio Júlio César?
Mas teremos problemas. Como nos comunicaremos? Como entraremos em sintonia com uma só língua, uma só cultura, uma só personalidade, um comportamento só, um costume só? Telepatia? Isso não significaria destruir quase todas as pessoas em suas características particulares que as marcaram em suas vidas? Perderíamos completamente o sentido da razão de porque estariam no Paraíso, o que fizeram em suas vidas, as suas histórias de vida, os seus comportamentos peculiares, os seus modos de agir etc.
A maior característica da Humanidade é a sua capacidade de diversificação entre seus indivíduos. E a religião se propõe a destruir isso, para que tudo seja uniforme, uma só massa, um só rebanho, um só grupo para louvar a um mito automaticamente, sem voz, sem opinião, sem poder, sem nada de nada. Só os mais tirânicos governantes almejaram isso. Falharam, pois a cultura humana não se submete assim tão fácil. Mas, claro, se um ser ultra-mega-poderoso quiser, nos curvaremos sob sua vontade. Então, por que permitiu que houvesse tantas diferenças culturais? Sadismo, por saber que tudo isso seria esmagado um dia?
Mesmo que todas essas características fossem preservadas, você conseguiria conviver com aquelas pessoas todas, tentando se entender umas às outras, tentando entender as características particulares de suas culturas?
Só para citar um exemplo recente, muitos estudiosos lingüistas aprenderam a falar línguas coloquiais de outras épocas (exemplo, o inglês do século XVIII ou XIX, para conversarem com falantes do século XXI), e tentaram conversar com os seus conterrâneos atuais, e não conseguiram ser compreendidos. Se isso já acontece na vida real, imagine como será conversar com um brasileiro do século XVI, ou até mesmo alguém do começo do século XX! Tentem ler Machado de Assis sem um dicionário, se bem que isso é fácil. Tentemos pegar a carta de Pero Vaz de Caminha para ler e interpretar. Vocês ganharão uma bela dor de cabeça. Hoje, com mil e uma linguagens internéticas, fica difícil entender o que miguxos e miguxas querem dizer. Quem nunca leu uma daquelas colunas de jornal, onde republicavam noticias de um século atrás? Porque acham que os livros são revisados periodicamente, para terem os seus textos atualizados e poderem ser compreendidos pelos seus leitores? Daqui a uns 30 anos, rirão de como escrevemos hoje, ainda em vias de adaptação ao Acordo Ortográfico, como nós rimos de como nossas avós escreviam “pharmacia”.
E o que dizer dos comportamentos, costumes, gestos, manias, atitudes? Como conviver com alguém que se comporta com um autêntico cavaleiro vitoriano do século XIX, e ele se escandalizar com nossas beldades semi-desnudas? Que tal pais do passado vendo como nossos filhos falam conosco hoje? E você, diante de um neandertal, que grunhe e não tem a menor cerimônia em cagar na sua frente enquanto você está tentando conversar com ele? Ou então, você esta tentando conversar com um ancestral irlandês do André, ele estiver retirando uma catota enorme do nariz e soltar um arroto estrondoso? Ou então com meu próprio ancestral, que usa roupas bufantes do período absolutista do século XVI, e me olha com um nariz empinado e extrema arrogância e menosprezo? Ou grupos de chineses tentando conversar com aborígines, e sendo mediados por índios amazônicos? Ou então uma reunião de cientistas de todas as épocas e lugares tentando se compreender entre si e conviverem entre si, para pelo menos compartilharem idéias ou desenvolver uma nova? Olha, isso não parece muito com o Paraíso, parece mais o Inferno!
Já podemos imaginar os Papas e teólogos (se é que vão para o céu…) tentando dialogar entre si, e nunca conseguirem se entender (mesmo porque, muitos Papas mataram concorrentes para usurpar o poder). Pensem em Lutero e Leão X saindo para beber uma cervejinha e… desculpem. Não há bebidas alcoólicas no Paraíso. Veremos Carlos X pedir desculpas a alguns huguenotes? Stalin dizendo para Trotski “Mal aí, camarada. Mudnia acontece)” (ta, ok. Quase todo mundo acha que Stalin não vai pro Céu, mas vocês compreenderam onde quero chegar).
Como disse, a vida no Paraíso seria um completo inferno, uma Torre de Babel multiplicada um milhão de vezes pior.
Só para piorar um pouco mais, experimente acrescentar todas as outras formas inteligentes de vida (os chamados alienígenas) no caldeirão. Quer melhorar o tempero? Acrescente a sua família inteira, todas as gerações dela, e imaginemos como será a vida no Paraíso com a sogra (cruz credo, mangalô pé de pato três vezes) para sempre, a nora, o padrasto, a madrasta, os primos chatos, a avó moralista e cheia de não-me-toques, o bisavô rigoroso e autoritário, o trisavô ausente e machista, o tetravô que não faz a menor idéia de quem você é. Quer sofrer mais ? Ponha a sua ex-mulher, a sua ex-namorada, as sogras, as ex-sogras, o namorado que foi ciumento na vida, o ex-marido, os nenês que você perdeu em abortos (se você for mulher), as crianças da família que morreram na infância (até poucas décadas atrás muitas crianças morriam antes de completarem 5 anos). E só para variar, sempre discutirão entre si, sempre se cobrarão uns aos outros, sempre irão se insuportarem aos outros para todo o sempre.
Se quiserem ter uma amostra disso na realidade, simplesmente peguem um cidadão de cada nação do planeta e os joguem em uma ilha deserta. Uma espécie de Lost, com 192 cidadãos diferentes entre si. Já pensaram nos resultados finais? Quem leu o livro “O Senhor das Moscas” (que não tem nada a ver com religião) sabe o que acarretará.
E depois, como podemos fazer para nos divertirmos? Dançar? Cantar? Cada grupo religioso tem as suas próprias preferências particulares e consideram todas as demais como blasfemas, hereges e “coisa do diabo”. André me lembrou que colocando um irlandês rezando em latim e outro ao lado cantando “Amazing Grace” vai acabar em porrada.
Imaginem islâmicos sunitas e xiitas lado-a-lado. Um talebã junto de um muçulmano liberal. Pensem num católico fervoroso com suas imagens e o bispo Sérgio Von Helder perto. Qual a alternativa que as religiões oferecem, já que você não poderá ouvir Kiss ou Bach? Cantar louvores e glórias… Ainda assim, cada religião tem as suas próprias e não aceitam as demais.
Em praticamente quase todas as religiões, elas dizem que estaremos no Paraíso com os nossos corpos físicos. Pouquíssimas falam de almas, espíritos, fagulhas de essência divina que se juntam com a divindade em questão, etc. E aí mora a charada. Com qual corpo iremos ao Paraíso? Imagine se você morrer mutilado, esmagado, explodido, atropelado, esmigalhado, metralhado, enforcado, fervido em óleo, baleado, morrer de uma bactéria devoradora de tecidos, doenças de pele, câncer, magreza extrema. Ou ate mesmo morrer de velhice, com um corpo decrépito e caindo aos pedaços. Pensem que muitas religiões pregam que só se seu corpo estiver inteirinho que você irá pro Paraíso.
Imagine só uma mulher que tenha morrido de velhice, por volta de uns 80 anos de idade. Com qual corpo ela irá? Aquele em que ela foi mais conhecida em sua fase final de vida, onde todos podiam reconhecê-la pelo que ela é? Ou então o corpo de um bebê, uma criança, uma adolescente, uma jovem gatinha, uma adulta, uma senhora de meia-idade? Mulheres ainda são mulheres. E suponha que o grande amor da vida dela morreu com 25 anos. Como eles passariam a Eternidade? Ele para sempre com 25 e ela para sempre com 80. Crueldade, não? Ela verá um monte de jovens bem bonitas, com as suas pernas roliças, pelinhos dourados ao Sol divino, seios durinhos e maravilhosos por baixo da toga (se é que vão vestir uma), enquanto o tempo cobrou o seu tributo em cima de sua pele. Crueldade, oh, crueldade!
Todos terão o corpo que tinham quando morreram? Ou poderão escolher o corpo que desejarem? E poderão ser reconhecidos? E quem os reconhecerá?
O que fazer se você teve pais que faleceram durante a sua infância? Você terá um corpo infantil para que eles o reconheçam? Ou você teve amigos e amigas que morreram durante a adolescência e vida adulta e você escolhera um corpo adulto? Ou prefere ficar com a melhor parte da sua vida madura, aquela com a qual mais se acostumou?
E se você for uma daquelas modelos que eram muito feias, que eram gordas quando crianças e adolescentes passaram por dezenas de cirurgias plásticas, e de repente, você voltou à sua antiga forma, com a pele flácida, manchas, cicatrizes, pequenos defeitos, e um pouco de feiúra aqui, feiúra acolá, com os seios caídos, bunda chata, sem todo aquele conjunto que fez sucesso em sua vida? Ou então um homem que passou por muita e muita academia para ter um corpo esculpido de músculos, e voltar à sua condição original de gordinho barrigudo? Michael Jackson chegará lá com cabelo Black Power e cara de menininho ou com a máscara disforme que chamavam de rosto ao final de sua vida? Aliás, ele cantará Thriller? Mortos é que não faltarão para participar do corpo de baile, hehehehe.
Não há nada que diga que você poderá ter o corpo que deseja ter. Tu vais ficar com o corpo com a qual morreu, meu filho. Não importa como, mesmo que o Paraíso se transforme em um asilo de eternos idosos.
Um belo problema, sem contar que muitas e muitas pessoas, durante os últimos milênios antes de nossos séculos XX e XXI, morreram bem mais jovens que os seres humanos atuais (que hoje podem viver ate os 70 anos), e naqueles tempos mal se chegavam aos 40 anos em média. Imaginem só a quantidade de crianças e bebês no céu. Conseguem imaginar a demanda por babás e creches divinas para cuidar de tudo isso? E passar a eternidade cuidando de milhões de bebês chorando, trocando as suas fraldas sujas (até porque elas não se limparão magicamente, não há nenhum livro sagrado afirmando isso. Enfim, o pensamento crental é esse “Se não está na Bíblia, não está valendo”). Qual o sentido da vida de um ser humano eternamente bebê, sem aprender nada, sem poder crescer, sem poder falar, sem poder se expressar adequadamente, sem poder vir aquilo que poderia ser, e assim por diante? Um tremendo desperdício de espaço e energia. O mesmo vale para velhinhos com Alzheimer. Quem cuidará deles? Que maravilha de problema, não é mesmo?
E o que vestir no Paraíso? Cada qual ficará com a sua própria roupa da época em, que viveram? E se você morrer usando um fio-dental, ou aquela camiseta horrorosa de cor laranja totalmente fora de moda? Por isso piadas de judeus alfaiates são bastante populares nas sinagogas. Imaginem que um cara machão, mas que tomou uns goros durante o carnaval e resolveu sair no Bloco das Piranhas. Chega lá, vestido à á Priscila, a Rainha do Deserto e encontra seus confrades lutadores de Vale Tudo. Ihhh
Os problemas de logística não acabam nunca. Administrar um paraíso deve exigir muito mais atenção desse deus judeu-cristão-islâmico, do que tomar conta do Planeta Terra, em que é notória a ausência dele nos assuntos mundanos, do qual foi desaparecendo paulatinamente do cenário da “história” humana, até ficar invisível, fantasmagórico, transparente etc. Lembram das antigas fábulas bíblicas, em que o tri-omni-fodão aparecia em tudo que era lugar, entrava na briga com o povo judeu, massacrava um monte de gente, aparecia em topo de montanhas, andava em Jardins do Éden, enchia o saco do Faraó do Egito, causava hemorróidas de ouro (sério!) em adversários, ficava de pinimba com Baal, tinha chiliques semelhantes a Primas Donas e surtava geral, como muitos “relatavam”. Tudo isso numa presença mais visível e atuante. Depois desapareceu. Ninguém nunca mais o viu. Tudo o que resta desse deus é o que esta nos livros sagrados, permanece na mente dos crentes como conceito abstrato, nos sussurros em latim de padres, ou na gritaria ensandecida de pastores evangélicos, ou no jargão popular onde ele leva todos os méritos por coisas na qual não teve a menor participação – aquele “graças a deus” – e esse ser fica com os testículos sendo puxados até o além. A mesma coisa com o Jesus, com a sua demora em retornar ao mundo dos vivos após 2000 anos desde que inventaram a lenda (lembrando que ele supostamente falou que chegaria quando o pessoal lá do século I ainda não teria morrido).
E eu já posso imaginar que, depois de ler todo o exposto acima, e isso foi só o começo, você já deve estar horrorizado e de saco cheio. Como bem disse Mark Twain – “Prefiro o Paraíso pelo clima, o inferno pela companhia”.
E, imagine, você tem uma vida eterna toda para agüentar tudo isso, sem reclamar! Sim, por toda a E-T-E-R-N-I-D-A-D-E. Você ira preferir se suicidar e por fim à sua vida, pois até mesmo os imortais se cansam de viver. Mas, pode-se cometer suicídio num lugar onde não se morre? Tolkien foi sábio quando disse que os elfos invejavam os homens pois estes últimos tinham a dádiva da morte, pois cansavam-se de ver tudo o que amavam deteriorar-se, enquanto que eles e seus reinos permaneciam imutáveis.
Não, suicídio está fora de questão, pois, como bem frisou John Constantine em uma de suas memoráveis frases (nos quadrinhos e não naquele filme comparativamente ridículo e vazio) – “Para onde vai o Diabo quando morre?”. Outra questão para os teólogos de plantão se entreterem por uns bons mil anos discutindo entre si.
Por esses motivos, eu é que não quero ir para o Paraíso. Prefiro dar valor à minha vida, que é limitada, curta, efêmera e breve, diante de um Universo que vai perdurar por vários bilhões de anos, e nem vai perceber que nos existimos um dia, e nem sentirá a nossa falta. Prefiro fazer minha vida ter significado HOJE. Não quero esperar por uma oportunidade que pode não vir. Religiosos usam e abusam da Aposta de Pascal. Daí eu pergunto: E se você se privou dos prazeres mais simples, como pegar a mão do seu filho e dar uma volta pela praia ao invés de se meter numa igreja calorenta, com trajes desconfortáveis, e nos últimos momentos perceber que esteve errado? Arrependimento? Em poucos instantes nem isso você terá, o que não fará diferença. E se você aparecer num Paraíso totalmente diverso do que você pensava, onde membros de sua religião seriam escravos miseráveis dos religiosos que enveredaram pela religião “certa”? Ok, eu corro este risco. O que isso significa? Que eu ficarei te lembrando pelo resto da maldita Eternidade:
Eu amei, eu vivi, eu rolei no tapete com meus filhos pequenos, amei minha mulher sob as estrelas, eu brindei com meus amigos, eu defendi pessoas injustiçadas entre tantas outras coisas. Cometi erros, mas também acertei. E você? Nada fizeste e parou no mesmo lugar que eu. Coitado de você. Não adianta chorar, pois nem esse tipo de emoção você terá aqui, nada para lhe consolar. Bem-vindo ao desespero.
Como disse Stephen King: “o Inferno é repetição”. Se é assim, então não importa qual religião você tenha, onde quer que você, eu e toda humanidade for depois que morrer será o Inferno.
Se a Aposta de Pascal está correta, Deus (qualquer um deles) ganha e todos os demais seres vivos perdem. A minha aposta, é melhor você viver a vida ou, como Aristóteles disse: “Pense no hoje, não confie no amanhã”.